...certo ou nem por isso...

Musa

Pego na minha guitarra, naquela que vai ser a décima tentativa hoje de criar algo novo. Não, minto! Minto descaradamente sobre algo que me é fundamental, que me alimenta nesta vivência que quero musical. Mas não é apenas um querer, uma vontade. Há também algo inexplicável que me puxa, que me atrai, que me enfeitiça. Essa música que se entranha na pele, e que me faz estremecer como o sopro do vento num dia sem calor.

Minto descaradamente porque crio, e crio porque sinto, sinto e volto a sentir. Talvez a música seja a caixa onde guardo o que sinto, ou o que sentia naquele momento, para que mais tarde o possa recordar, aquele sentimento único, que me preenchia até transbordar. A música é por isso o meu diário, e cada música que crio é uma página que pretendo ver guardada para sempre. Mas, à medida que as páginas se acumulam, e as guardo carinhosamente para mais tarde recordar, lembro-me de que todos esses momentos se referem a alguém. Alguém que me inspirou como mais ninguém o poderia fazer. A Musa. Alguém que só por isso merece a sua própria caixa de música, com a melodia própria do momento em que a criei. Mas no entanto, ao fim de tantas caixas, apercebo-me que aquilo que quero não são caixas nem caixinhas onde guardo as recordações e os momentos que me marcaram. Aquilo que procuro e que sempre procurei é aquilo que irei procurar sempre, até ao dia em que finalmente o encontre, seja nesta ou noutra vida. Não me interessa, procurá-lo-ei incessantemente e sempre, mas sempre, com todas as minhas forças. E aquilo que procuro incessantemente é a página do diário que jamais terei de guardar. Aquilo que procuro incessantemente é a caixa da música que jamais terei de fechar, que manterei para sempre aberta, uma caixa sem fundo para que caibam lá dentro todas as músicas de todos os momentos que criei... Aquilo que procuro? Aquilo que procuro é a Musa, a minha Musa!